“O digital é um salto quântico na maneira como se fazem as coisas”

Catarina CorreiaHead of Marketing & Communication na CEGOC

Robôs que trabalham lado a lado com humanos, Realidade Virtual que permite colocar profissionais de vários pontos do globo no mesmo cenário onde é preciso resolver um problema, conteúdos de aprendizagem on demand disponíveis onde e quando mais precisamos e introdução crescente de mecanismos de automação, robotização e Inteligência Artificial que, aliados a uma verdadeira “revolução” de competências em curso, irão inaugurar um novo mercado de trabalho do futuro muito mais dignificante para o ser humano… não é ficção científica, são os efeitos reais da digitalização a que assistimos todos os dias. E foi este um dos vários temas em debate no webcast “A formação como um processo contínuo de evolução”, organizado pela revista Pessoas com o apoio da CEGOC.

 

Este encontro juntou João Braz Pereira, General Manager da FranklinCovey Portugal e Head of Costumer Performance Development na CEGOC; Daniel Silva, Diretor de RH na Amorim Cork Composites; e Alberto Rendo, Diretor de RH na IKEA Industry Portugal.

 

 

De entre todos os temas atuais e pertinentes abordados, destacamos as seguintes conclusões:

 

- A pandemia veio alterar a nossa perceção e gestão do tempo

A crise sanitária veio colocar em evidência a obsolescência do paradigma de estabilidade e previsibilidade que permitia desenvolver competências em ciclos de tempo relativamente longos, recorda Alberto Rendo, acrescentando que “esse tempo acabou, os contextos de negócio não permitem mais fazer isso e o que temos que fazer nas empresas é dar o volante às próprias pessoas para serem elas a conduzir o seu percurso de desenvolvimento, a decidirem quais as experiências que querem ter, as competências que querem desenvolver, os percursos profissionais que lhes dão motivação.  Precisamos de modelos de gestão de pessoas que garantam as duas competências essenciais para o futuro a partir das quais se constroem outras – a agilidade e a flexibilidade.”

 

- Existe hoje uma nova mentalidade e atitude perante a formação

Daniel Silva destaca a facilidade com que é hoje possível aceder à informação e à formação, ressalvando, contudo, que “aquilo que se aprende nos momentos formais de educação é uma ínfima parte daquilo que hoje em dia precisamos para ser bem-sucedidos e evoluir profissionalmente. Tem de haver um acompanhamento permanente, quer do ponto de vista dos programas de ensino, quer do ponto de vista do suporte de qualquer pessoa que queira manter-se atualizada e competente”. Tendo em conta a sua experiência na CEGOC, João Braz Pereira reforça que há uma mentalidade e uma atitude diferente perante a formação: É cada vez mais comum encontrarmos pessoas mais confortáveis com a utilização de idiomas para além do português, pessoas com mais competências na utilização de ferramentas digitais, pessoas que viajaram mais e que se assumem como protagonistas do seu próprio processo de aprendizagem.”

 

- O futuro passa por colocar o formando no centro do processo de aprendizagem

“Se há um ano o desafio era garantir a qualidade da experiência dos participantes num webinar, ao longo dos últimos 12 meses os nossos clientes confiaram em nós para responder a desafios completamente novos como a realização de convenções e projetos formativos para organizações que operam em contextos internacionais, com centenas de pessoas espalhadas por todo o planeta, com recurso a palcos virtuais, de dinâmicas em grupos e subgrupos geograficamente dispersos, produção de vídeo e utilização de uma quantidade enorme de recursos digitais de que já dispúnhamos e que desenvolvemos para projetos específicos”, revela João Braz Pereira, sublinhando que, cada vez mais, o formando está no centro da atividade de formação e por isso “é importante proporcionar-lhe uma boa experiência, fazer com que sinta que estamos a acrescentar valor e estamos a disponibilizar conteúdos, ferramentas e conhecimentos que são imediatamente úteis. É importante ainda trabalhar formatos como mentoria e coaching, a dinamização de comunidades de aprendizagem e a criação de dinâmicas de peer coaching, em que colegas com o mesmo tipo de desafios se comprometem com a mudança e a melhoria e se acompanham e suportam no contexto de trabalho”.

 

- Modelos de subscrição para aprender onde e quando precisar

João Braz Pereira destaca esta tendência já posta em prática pela CEGOC através de “uma biblioteca de conteúdos e ativos digitais quer do Grupo CEGOS, quer da FranklinCovey, que permitem a formadores e formandos o acesso a conteúdos e a percursos formativos no momento em que precisam deles”. As organizações aderem cada vez mais a formatos de formação que possibilitam o acesso ilimitado a conteúdos durante um período de tempo mais ou menos longo, para que possam ser ajustados às suas necessidades nos momentos em que deles necessitam“se eu tiver amanhã uma reunião em que tenho que definir os objetivos da minha equipa, posso aceder hoje a conteúdo importante para preparar a condução dessa reunião, por exemplo”, completa Braz Pereira.

 

- Reskilling e Upskilling são estratégias fundamentais de competitividade

Uma é mais incremental, mais focada no desenvolvimento de competências para as pessoas poderem desempenhar melhor as atividades que já vão fazendo (Upskilling) e outra mais disruptiva, que visa preparar as pessoas para fazerem coisas que não fazem à data, com competências e conhecimentos diferentes daqueles que têm (Reskilling) – e aqui destaco temas como robotização, automatização, IA, e-commerce, digitalização ou desmaterialização da formação… dinâmicas que poderão deixar um grupo de trabalhadores para trás se não adotarmos, enquanto sociedade, empresas e o próprio Estado, ferramentas e estratégias para capacitar estas pessoas para o trabalho do futuro”, começa por explicar Daniel Silva. Alberto Rendo continua o raciocínio e acrescenta que “temos de ser transparentes com as pessoas sobre esta transformação; dizer-lhes que o seu contributo é muito relevante; e retirar-lhes o medo – porque se há coisa que a transformação digital tem de bom é que é muito fácil aprender, basta vermos como os nossos pais e avós manuseiam um telemóvel”.

 

- Várias organizações reforçaram os seus planos de formação durante o confinamento

Daniel Silva refere que na Amorim Cork Composites, durante o período de pandemia, o que era o plano de trabalho manteve-se e foi até acelerado, “sobretudo porque a nossa realidade é a de uma multinacional portuguesacom equipas espalhadas por 13 países e que tem que encontrar formas de capacitar da mesma forma um colaborador na China ou em Portugal”. Também Alberto Rendo frisou a importância da requalificação em tempos conturbados, revelando que a nível internacional, a IKEA aproveitou situações em que houve paragens de produção para trabalhar nas “capabilities” das suas equipas. “A empresa aproveitou para repensar o negócio nas suas mais diferentes perspetivas, o que acabou por dar origem a uma série de transformações, novas ideias de produtos e formas de produção. Para o futuro a curto e médio prazo, a tendência será aumentar o investimento em formação”, conclui.

 

- Existem vários “eixos” que ajudam a medir o retorno do investimento em formação

Na Amorim Cork Composites, o impacto dos programas de formação e desenvolvimento podem ser medidos através de três grandes eixos, explica Daniel Silva: um primeiro, orientado para resultados, onde tentamos que os nossos programas sejam sobretudo experienciais e permitam uma transposição direta para o contexto profissional de cada formando; um segundo, que se manifesta na possibilidade dos colaboradores poderem progredir dentro da organização e desempenhar diferentes funções; e um terceiro, que tem a ver com a motivação e retenção dos colaboradores através do seu desenvolvimento com programas que lhes permitam viver outras experiências”. Para Alberto Rendo também existem dois eixos para medir este retorno: o dos resultados e o das “capabilities”: “monitorizar o nível de melhoria contínua das equipas, o nível de autonomia, o índice de satisfação e motivação, os processos de liderança… tudo isto são indicadores que nos evidenciam a capacidade que a organização tem de produzir resultados operacionais e financeiros de forma sustentável – e isso nós fazemo-lo permanentemente sobretudo através de uma abordagem LEAN ao trabalho.”


- A liderança atua como catalisador e impulsionador da aprendizagem

Quando questionado sobre as transformações emergentes e o seu impacto na formação, João Braz Pereira sublinha que é decisivo para as organizações terem a capacidade de ler o contexto, perceber o que está a acontecer e conseguirem transmitir às suas equipas o sentido dessa mudança. “Se as lideranças forem capazes de transmitir isso às suas equipas, os colaboradores deixam de estar num papel em que são vítimas da mudança e passam a ser protagonistas, porque percebem qual é o seu contributo específico para o processo de mudança”. Continuando este raciocínio, Daniel Silva refere que “a liderança tem um papel fundamental enquanto catalisador e impulsionador da aprendizagem; mas também as empresas como um todo têm um papel fundamental na criação de condições para que as pessoas possam evoluir, aprender e encontrar formas de se adaptar à realidade.” 

 

- O digital derrubou as barreiras espácio-temporais que existiam na formação

João Braz Pereira considera que até os mais céticos comprovaram na prática que é possível garantir a eficácia da formação em formato digital: A pandemia veio desmistificar estas ideias de que “não é possível” e de que “a qualidade da experiência é completamente diferente”. No digital o tempo e o espaço deixam de ser uma barreira – é possível flexibilizar e deixamos de ser vítimas da tirania do calendário. Daniel Silva concorda, referindo que hoje desenvolvemos “percursos formativos que compatibilizam diferentes ferramentas disponíveis e ajudam a colmatar a ausência do presencial”, lembrando ainda que “o contexto virtual permite-nos contactar com colegas, clientes e todo o tipo de stakeholders de uma forma mais rápida, mais ecológica, com menos custos e mantendo a qualidade do trabalho e até a nossa qualidade de vida”. Relativamente às potencialidades do digital, Alberto Rendo partilha que na IKEA Industry Portugal já é possível que um técnico de manutenção em Portugal se ligue a um técnico na China, através de Realidade Virtual, para que este o apoie na resolução de um problema numa máquina. Em parceria com a Universidade do Minho, a empresa também tem em curso um projeto de robotização colaborativa – “neste momento já temos células de produção em que trabalham lado a lado um robô e uma pessoa: o robô aprende com a pessoa e percebe os seus limites e necessidades”, explica.

 

- A virtualização excessiva acarreta perigos

A principal preocupação manifestada por Daniel Silva em relação ao digital relaciona-se com a perda de impacto dos mecanismos informais de aprendizagem: “se caímos no erro de pensar que tudo pode ser virtual, podemos perder a relação entre colegas, as partilhas de práticas e experiências – que são uma fonte de formação e desenvolvimento fundamental nas organizações”.Outra preocupação, partilhada tanto por Alberto Rendo como por Daniel Silva tem a ver com a cultura organizacional e com o excesso de virtualização da nossa realidade no contexto de trabalho –“temos de pensar como é que vamos sentir a cultura organizacional, como vamos, num ambiente necessariamente diferente, preservar os nossos valores ou adaptar a nossa cultura e valores a esta realidade.” Também João Braz Pereira pede cautela com o “deslumbramento” tecnológico, já que “independentemente dos formatos, de se é síncrono ou assíncrono, se é Realidade Aumentada, se é um modelo de subscrição, se tem um LMS ou não, é importante ter sempre presente que tem de haver um objetivo de negócio por trás, é isto que nos vai dizer no final se conseguimos atingir o objetivo ou não… não é a tecnologia nem o virtual”.

 

- O mercado de trabalho vai dignificar ainda mais o ser humano

João Braz Pereira acredita que o futuro do mercado de trabalho vai girar em torno de variáveis relacionadas com a digitalização, a IA e os algoritmos e a sua capacidade de fazerem determinadas funções de forma mais capaz e com menos risco para o homem… “tal como acontece já nas portagens, nas caixas de supermercados e vai acontecer a breve prazo na condução”. Já Daniel Silva está convencido que a muito curto prazo assistiremos à alteração do mix de profissões disponíveis – “trabalhos que vão deixar de existir, outros que vão ser feitos de maneira diferente, mais automatizados e sem recurso à força humana, o que nos vai obrigar a encontrar mecanismos de requalificação e novos propósitos para todas essas pessoas”. Nesta linha de pensamento, Alberto Rendo confia em que “se conseguirmos através da digitalização e da Indústria 4.0 fazer com que os trabalhos que não dignificam o ser humano possam ser feitos por máquinas, será uma grande vitória”.

 

- A verdadeira diversidade de inclusão reside nos talentos individuais

Alberto Rendo considera que “Não há maior expressão da diversidade humana do que os talentos de cada um” e que incluir e fomentar esses talentos é não só bom para a empresa como uma fonte de felicidade para as pessoas,que procuram experiências em torno dos seus talentos e experiências que lhes permitam dizer “eu faço o que gosto”, “eu faço aquilo para o qual sou naturalmente dotado”. Este é o movimento de dignificação que tem de ser feito para criar as condições para que as pessoas se expressem e construam os seus percursos, as suas carreiras e o seu futuro.”


Assista à gravação completa do webcast “A formação como um processo contínuo de evolução”:


 

Escrito por

Catarina Correia

Com mais de 16 anos de experiência na área de Marketing e Comunicação, sou uma entusiasta do marketing digital, com uma paixão especial por geração de leads e análise de resultados.

Atualmente, como Head of Marketing & Communication na Cegoc, dedico-me a criar estratégias que não só elevam a marca, mas também enriquecem as experiências de aprendizagem.

No centro do meu trabalho está a vontade de conectar, educar e inspirar através de estratégias de marketing bem pensadas e comunicação autêntica. Acredito firmemente que um marketing eficaz pode, e deve, servir como um catalisador para a aprendizagem contínua e desenvolvimento pessoal e profissional. Em cada projeto que abraço, procuro inovar e trazer novas perspetivas que possam não apenas atingir os objetivos de marketing, mas também enriquecer o setor de L&D com insights frescos e relevantes.

Este é o desafio que me mantém motivada e em constante busca por novas aprendizagens e melhores práticas na interseção entre Marketing, Comunicação e Formação.

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