E de repente… já nada será como dantes!

Ricardo MartinsCEO na CEGOC

Quantos de nós já lêramos ou ouvíramos falar de Wuhan? Ou, em especial, na província de Hubei? Ainda há tão poucas semanas viajávamos para outros continentes, náufragos de intermináveis reuniões de trabalho, destemidos no contacto com outras pessoas, entravamos sem receios nos escritórios das mais variadas empresas e, mais ou menos, atentos às notícias que chegavam da Lombardia, região rica e civilizada no centro da Europa, praticamente nenhum de nós admitia que esta inevitabilidade chegaria de supetão, enleada no pânico sanitário de um vírus, inimigo invisível desprovido de vida, também por isso mesmo mais temível.

 

 

Agora, confinados às nossas cozinhas, negociando à vez uma nesga de silêncio no sofá da sala de estar, improvisamos escritórios caseiros, pomposamente renomeados Home Offices como se de repente tivéssemos todos virado súbditos de sua majestade, sem ideia de quando será seguro voltarmos a sair à rua, a dar apertos de mão e abraços, e partilhar, lado a lado, o gosto de aprender com as experiências daqueles com quem generosamente nos relacionávamos.

 

É… num ápice, tudo mudou. Milhões de pessoas tiveram de fazer, em autêntica panela de pressão, um curso de teletrabalho, gestão da mudança, remote management, e mais uns tantos para (re)aprender a fazer face a mais este desafio civilizacional.

 

A grande lição? Tantas por onde escolher, mas se há algo que tenho aprendido nestas semanas é que ainda há heróis. E que herói não tem de ser o mais corajoso ou mais forte. Que para muitos a luta faz-se com a arma da paciência, uma virtude que nos tempos em que vivemos já quase se perdeu e que ainda vamos a tempo de reavivar e praticar.

Que muitos outros heróis usam realmente fato (alguns dignos da ficção científica) e máscara, e encontram-se na linha da frente, nos hospitais, nos táxis, nas lojas… Heróis sem rosto, que tantas vezes apenas nos falam com os seus olhos. Mas, e se é nos olhos que se encontra a alma, a sua alma é do tamanho do Universo, com uma humanidade para a qual não há palavras.

Tirei também uma outra lição, acho que todos tirámos, que afinal não somos perenes. Enfrentemos a nossa mortalidade, retiremos as ilações do processo complexo em que nos encontramos. Eternos são os resultados dos nossos atos. Esperemos que neste contexto os nossos atos coletivos sejam um legado inspirador e virtuoso para as gerações que se seguem.

Por fim, e porque tenho o prazer de liderar uma organização que há mais de 57 anos aposta numa mudança de paradigma para o desenvolvimento do talento em Portugal e no mundo; que há mais de 20 anos explora novas formas de virtualizar o processo de aprendizagem, e logo também o do trabalho, com ferramentas colaborativas digitais utilizadas mesmo em contexto de sala; que sempre abraçou as novas tecnologias mesmo quando elas eram ainda realmente novas (e feínhas!), com o propósito de colocá-las ao serviço das pessoas e organizações e com isso torná-las mais audazes e competentes para enfrentarem, hoje e no futuro, os seus desafios mais significativos, sem nunca esquecer a necessidade de humanizar a experiência de cada formando; também estou especialmente atento ao que, afinal, está ao virar da esquina.

 

Cientes que o desenvolvimento tecnológico foi uma das imagens de marca das primeira décadas do século XXI, preconizámos a necessidade de elevar o Digital Learning como método de aprendizagem que traria resultados relevantes para aqueles que quisessem antecipar tendências.

 

Sabíamos que o trabalho e a aprendizagem à distância teriam, inevitavelmente, de ganhar preponderância e destaque nos novos modelos laborais e sociais. Só não sabíamos que o teste à sua viabilidade estaria envolto em tanto dramatismo e que teria de ser desenvolvido abruptamente num tão curto espaço de tempo. Muitas organizações estavam (e estão!) ainda mal preparadas para algo tão drástico e súbito, como esta transformação ad hoc em escala. Sinto, apesar de tudo, que a generalidade do tecido empresarial português está a passar com distinção e mérito por este período de adaptação. Acredito que tivemos, também, o nosso mérito nacapacidade de transmitir a mensagem junto de tantos parceiros que nos procuraram ao longo destes anos e de tantos outros que também, sobretudo nestes últimos dias, nos desafiaram a encontrar soluções para transformar, com sucesso, projetos formativos em experiências de aprendizagem 100% digitais.

Lutemos, pois, por nós, por aqueles de quem mais gostamos e por todos aqueles que constituem a nossa comunidade. Não devemos dar nada por garantido. Desfrutemos o que temos e ousemos chegar mais além, porque depois disto já nada será como dantes!

 

*Este artigo foi originalmente publicado na revista Líder.

Escrito por

Ricardo Martins

Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia do Porto e formado em Gestão e Marketing pelo INSEAD, Ricardo Martins soma no seu currículo uma experiência nacional e internacional de mais de 20 anos nas áreas de consultoria, formação e desenvolvimento profissional. Depois de integrar a Global Team International Marketing Consultants, onde trabalhou na implementação de projetos de Marketing Operacional aplicados a empresas de renome como a Coca-cola, Heineken, P&G ocupa atualmente o cargo de Diretor Geral da CEGOC em Portugal. A CEGOC integra o Grupo CEGOS, líder internacional na área de Learning & Development, com quase um século de experiência e presença ativa em mais de 50 países.
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